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Capítulo 4

 

 

As Viagens de HPB ao Tibet

 

            A questão da estadia de HPB no Tibete está envolta num considerável mistério. É provável que nunca venhamos a conhecer exatamente quando nem quantas vezes ela penetrou nesse território. Ela afirma que:

 

“... vivi em diferentes períodos tanto no Pequeno Tibet quanto no Grande Tibet, e esses períodos combinados formam mais de sete anos. Porém, nunca afirmei, seja verbalmente ou sobre minha assinatura que havia passado sete anos consecutivos num convento. O que eu disse, e agora repito, é que parei em conventos Lamaísticos; que visitei Tzi-gadze, o território de Tashi-Lhunpo e suas redondezas e que estive bem mais para o interior, e em certos lugares do Tibet que nunca foram visitados por quaisquer outros europeus”. (CW VI, 272)

 

            É importante manter em mente que embora HPB tenha realmente ido ao Tibet, isso não significa que toda vez que ela menciona estar no Tibet esteja necessariamente se referindo ao próprio Tibet, uma vez que esse termo era usado de um modo muito geral e que o Ladakh também era conhecido como Pequeno Tibet. Os biógrafos de HPB costumam ter problemas em achar sete anos, ainda que em períodos separados, para suas estadas no Tibet. Boris de Zirkoff na introdução da coletânea dos escritos de HPB, escreve:

 

“Presume-se que HPB foi via Índia para algumas partes do Tibet, e que isso ocorreu em alguma época de 1868; há menções de sua passagem cruzando as Montanhas Kuenlon e indo via Lago Palti (Yamdok-Tso), embora isso seja geograficamente inconsistente. Foi nessa viagem para o Tibet que ela encontrou o mestre KH pela primeira vez, e morou na casa de sua irmã, em Shigadze. Esse pode ter sido o período em que ela passou cerca de sete semanas nas florestas não longe das Montanhas de Karakorum.” (CW I, xlviii)

 

 

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Tentativas de Entrar no Tibet (década de 1850)

 

            Sinnett menciona que HPB fez uma primeira tentativa frustrada de entrar no Tibet ainda no período inicial de suas viagens. Após ir ao Ceilão com o “inglês” e o chela hindu, o grupo chegou a Bombay, onde se dispersou, pois:

 

“... cada um estava empenhado num objetivo algo diferente. Madame não aceitaria a direção do Chela e estava resolvida a fazer uma tentativa, por ela mesma, de entrar no Tibet através do Nepal. Por essa ocasião, sua tentativa falhou, principalmente, acredita ela, no que diz respeito às dificuldades externas e visíveis, pela oposição do então Residente britânico no Nepal”.(Sinnett 1886, 66)

 

            Olcott, em março de 1893, relata ter se encontrado com o major C. Murray, numa viagem de trem. O major lhe declarou que havia encontrado com HPB em 1854 ou 1855 em Punkabaree, aos pés das montanhas de Darjeeling. Era então capitão e comandava os Sepundy Sappers and Miners.

 

            Madame Blavatsky estava tentando entrar no Tibet, via Nepal, para escrever um livro e, para tanto, queria cruzar o rio Rungit. Quando a guarda reportou ao então capitão Murray que uma senhora europeia havia passado para aquele lado, ele foi atrás dela e a trouxe de volta. Ela ficou muito brava, mas foi em vão. Ela passou perto de um mês com ele e sua esposa, e depois partiu. Na ocasião, ela aparentava cerca de trinta anos.

 

            Olcott ainda diz que o capitão Murray tinha ordens escritas de não permitir que nenhum europeu atravessasse o rio Rungit, pois eles quase que certamente seriam mortos pelas tribos selvagens daquele país. (Neff, 58)

 

            Entretanto, há alguns pontos estranhos no relato de Murray. Na verdade, o risco para os viajantes não vinha de “tribos selvagens” no Sikkim, pois elas não existiam, mas sim de uma guerra que havia entre o Nepal e o Tibet, que foi do início de 1855 até abril de 1856. Durante esse período, as passagens entre o Nepal e o Tibet ficaram fechadas. (Gilbert)

 

            Note-se que Murray declara que seu encontro com HPB aconteceu em 1854 ou 1855, e não em 1853 como Sinnett relata. Se essa viagem foi com o “inglês” norte americano Albert Rawson, uma época provável para a viagem é a mencionada por Murray (1854 ou 1855).

 

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            Outro aspecto que reforça a data dada por Murray é o fato de que ele só foi apontado como comandante do Sapers and Miners em julho de 1854. Apesar dele dizer que era capitão, sua patente era a de tenente. Ele só foi promovido a capitão em 28 de dezembro de 1857, época em que Madame Blavatsky já estaria fora da Índia, uma vez que ela diz ter deixado esse país um pouco antes do motim em Meerut, que ocorreu em 10 de maio de 1857. (Gilbert)

 

            A segunda tentativa de HPB para entrar no Tibet foi descrita em seu livro Ísis Sem Véu. Em 1856, após ter se encontrado em Lahore com um alemão e dois amigos, os quatro viajaram juntos por um tempo e foram, pelo Kashmir, para Leh, no Ladack, em companhia de um shaman tártaro.

 

            Madame Blavatsky diz que, com a ajuda do shaman, entrou no Tibet, de onde foi resgatada no deserto por um grupo liderado por um Shaberon (um Adepto) e guiada de volta à fronteira por caminhos que lhe eram desconhecidos. Após mais algumas viagens pela Índia teria deixado o país pouco antes dos problemas que ocorreram na Índia 1857, por recomendação de seu “guardião oculto”. (Sinnett 1886, 72)

 

 

Na Casa do Mestre KH e o Aprendizado de Inglês

 

            Outra viagem de HPB ao Tibet, tradicionalmente situada em 1868, não é sequer mencionada por Sinnett. Aliás, ele mal menciona a período entre 1867 e 1870. Conta apenas que esses anos foram passados no Oriente e em algumas viagem pela Europa e que nesse período houve um grande progresso na expansão de seu conhecimento oculto.

 

            Supõe-se que HPB tenha ido, via Índia, para algumas partes do Tibet, e que isso ocorreu em alguma parte do ano de 1868. Foi nessa viagem ao Tibet que ela encontrou com o Mestre KH pela primeira vez e viveu na casa de sua irmã em Shigatze. Ela relata um episódio dessa estadia em carta para Sinnett, ao lhe contar sobre o método que o Mestre KH usara para lhe ensinar a língua inglesa, que até então limitava-se ao que uma governanta havia lhe ensinado na infância.

 

            Uma das acusações do relatório da Sociedade de Pesquisas Psíquicas (SPR) que a acusou de charlatã, era que seu inglês e o do Mestre KH tinham muitas semelhanças. Na carta a Sinnett, HPB explica o porquê:

 

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“Fui para a cama e tive a visão mais extraordinária. Eu havia em vão chamado os Mestres – que não vieram em meu estado de vigília, mas agora no sono eu via a ambos. Eu estava novamente (uma cena de muitos anos atrás), na casa do Mahatma KH. Eu estava sentada sobre um tapete, num canto, e Ele andando pela sala em seu traje de montaria e o Mestre falava com alguém atrás da porta. “Eu lembrar não posso” – pronunciei em resposta à Sua pergunta sobre uma tia falecida. – Ele sorriu e disse: “Que inglês engraçado que você usa”. Então eu me senti envergonhada, ferida em minha vaidade, e comecei a pensar (imagine você, em meu sonho ou visão que era a exata reprodução do que ocorreu, palavra por palavra, há dezesseis anos atrás) “agora que estou aqui e falando tão somente em inglês em linguagem verbal fonética, posso talvez aprender a falar melhor com Ele.” (Para deixar claro, com o Mestre eu também usava o inglês, que fosse bom ou ruim dava no mesmo para Ele, uma vez que não fala, mas compreende cada palavra que eu falo da minha cabeça e eu consigo compreendê-Lo – o como eu nunca poderei dizer ou explicar, mesmo que me matassem, mas eu compreendia.” (MLcr., 454)

 

            Ela continua contando que em seguida, ainda no sonho, teve uma visão onde haviam se passado três meses, e agora ela estava de pé diante do Mestre KH, para quem havia levado um pedaço de papel onde traduzira para o inglês algumas frases em Senzar, para que Ele visse se estavam corretas:

 

“Ele pegou e leu, e corrigindo a interpretação leu novamente e disse “Agora seu inglês está melhorando – tente captar de minha cabeça o pouco que eu conheço”. E colocou sua mão em minha testa, na região da memória e espremeu seus dedos nela (e eu senti até mesmo a mesma dor superficial nela, como então, e o arrepio frio que experimentei) e desde aquele dia Ele fazia isso em minha cabeça diariamente, por cerca de dois meses. Novamente a cena muda e eu estou indo embora com o Mestre, que está me mandando de volta para a Europa. Eu estou dando adeus para sua irmã, para o filho dela e para todos os chelas. Eu ouço o que o Mestre me diz. Então vêm as palavras de despedida do Mahatma KH, rindo de mim, como Ele sempre fazia e dizendo: “Bem, se você não aprendeu muito das Ciências Sagradas e do Ocultismo

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prático – e quem poderia esperar que uma MULHER aprendesse – você aprendeu, de qualquer modo, um pouco de inglês. Agora você fala apenas um pouco pior que eu!”, e Ele riu.” (MLcr., 454)

 

            Em 11 de novembro de 1870, sua tia Nadyezhda de Fadeyev recebeu a primeira carta conhecida do Mestre KH, afirmando que HPB estava bem e que estaria de volta “antes que 18 luas tenham passado”. (LMW 2nd Series, 4) A carta foi escrita num papel de arroz, feito à mão, que é característico da região do Kashmir e Punjab.

 

 

Fundação da “Société Spirite” no Cairo

 

            Sinnett relata que em 1870 Madame Blavatsky estava novamente na Europa, tendo voltado “do Oriente de vapor via o recém aberto canal de Suez”. (Sinnett 1886, 154). Foi então para a Grécia e para Chipre, onde encontrou com o Mestre Hillarion.

 

            Em junho de 1871, ela embarcou no vapor SS Eunomia, que ia de Chipre para Alexandria. Devido à explosão da carga de pólvora que transportava, o vapor naufragou. Entre os poucos passageiros que se salvaram estava Madame Blavatsky. O governo grego ajudou os sobreviventes, dando-lhes a passagem até seu destino. HPB chegou ao Cairo sem dinheiro ou bagagens, uma vez que tudo havia se perdido no naufrágio.

 

            No Cairo, Madame Blavatsky resolveu fundar uma sociedade que tinha por objetivo a investigação de fenômenos psíquicos, à qual denominou Société Spirite. Conheceu então Emma Cutting que trabalhava no Hotel Oriental, e que lhe foi de grande auxílio tanto em sua situação pessoal difícil quanto na Société Spirite. Emma casou-se com Alexis Coulomb, um francês nascido no Egito, tornando-se a Sra. Coulomb. Numa de suas descrições de viagens pelo Egito, escrita em 1874, Peebles descreve Emma Coulomb como uma auxiliar de HPB:

 

“Madame Blavatsky, ajudada por outras almas valentes, formou uma sociedade de espíritas no Cairo, cerca de três anos atrás. (...) A senhora cujo marido cuida do Hotel Oriental é uma espírita convicta. Impulsionado pelo espírito missionário, deixei um pacote de panfletos e folhetos com ela, para distribuição gratuita”. (Peebles, 297)

 

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            Emma Coulomb também tinha algumas capacidades psíquicas, como escreveu anos mais tarde o Mestre KH para Franz Hartmann: “Mad. Coulomb é uma médium e, como tal, irresponsável por muitas coisas que ela possa dizer ou fazer.” (LMW 2nd Series, 131)

 

            O periódico Human Nature de abril de 1872, publicou a notícia da formação da Société Spirite de HPB no Cairo e seu anúncio pedindo médiuns, os quais iriam “demonstrar a existência de seres espirituais”. (Burns) No anúncio HPB oferecia aos médiuns hospedagem sem qualquer custo, em sua própria casa. Porém em pouco tempo a tentativa provou-se um fracasso. De acordo com HPB, as médiuns francesas, amadoras, de quem ela se rodeou:

 

“... roubam o dinheiro da Sociedade, bebem como esponjas, e agora as peguei enganando, da maneira mais vergonhosa, nossos membros que vêm para investigar os fenômenos, com falsas manifestações.” (Sinnett 1886, 159)

 

            Ela então rompeu todas as relações com as médiuns, fechou a Société Spirite e foi morar em Boulak, próximo ao Museu. De acordo com Sinnett, nessa ocasião:

 

“... ela entrou novamente em contato com seu velho amigo, o Copta de fama misteriosa, cuja menção foi feita em conexão à sua primeira visita ao Egito, no início de suas viagens. Por várias semanas ele foi seu único visitante.” (Sinnett 1886, 160)

 

 

Morte de Agardi Metrovitch

 

            Nas cartas para Sinnett, HPB conta um episódio que ocorreu em 1872, no Cairo, envolvendo Agardi Metrovitch, a quem já mencionamos em conexão com Yuri. Metrovich era um revolucionário mazinista que havia insultado o Papa tendo sido por esta razão exilado de Roma em 1863. Ela conta que Agardi Metrovitch havia ido ao Cairo, a pedido de sua tia, para tentar encontrá-la. Ali alguns malteses:

 

“... instruídos pelos monges católicos romanos, prepararam uma armadilha para pegá-lo e matá-lo. Fui avisada por Illarion então fisicamente no Egito – e fiz com que Agardi Metrovitch viesse diretamente até mim e não deixasse a casa por dez dias. Ele era um homem corajoso e ousado e não podia tolerar isso, então foi

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mesmo assim para Alexandria e eu fui atrás dele (...) fazendo como Illarion me disse (...). Eu nunca o deixei, pois sabia que ele iria morrer, como Illarion havia dito, e assim aconteceu.” (LBS, 189-190)

 

            Ela ainda relata para Sinnett que nenhuma igreja quis enterrá-lo e que os franco-maçons, a quem apelou, também ficaram com medo. Então, com a ajuda de “um abissínio – um discípulo de Illarion – e com o servente do hotel nós cavamos uma cova embaixo de uma árvore a beira do mar (...) e enterramos seu pobre corpo.” (LBS, 190)

 

            HPB permaneceu na Cairo até aproximadamente abril de 1872. Foi então para a Síria, Palestina e Constantinopla e parece ter ido até Palmira (na Síria). Em companhia da Condessa Lydia Pashkoff, foi até Dair Mar Maroon, próxima às montanhas do Líbano. Ela chegou a Odessa em julho de 1872, reencontrando a família no prazo dado pelo Mestre KH de “18 luas”.

 

 

 

William Quan Judge e o Coronel Henry S. Olcott.

 

 

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