A FALECIDA DRA The Late Mrs. Anna Kingsford, M.D. – Helena Petrovna Blavatsky

Índice Geral das Seções   Índice da Seção Atual    Índice da Obra Atual   Anterior: A “Mulher” Não é uma Mulher, Mas Sim a Alma e a Intuição   Seguinte: Verdadeira e Esotérica Doutrina da Encarnação Divina

 

 

 

(p. 32) (*)

4. A QUEDA, OCASIONADA PELO SACERDOTALISMO

ATUANDO SOB CONTROLE SATÂNICO,

POR MEIO DA PERVERSÃO DA CONSCIÊNCIA ESPIRITUAL

(Edward Maitland)

 

            1. (*) Para a Bíblia, então, em seu sentido esotérico e divinamente pretendido, a “mulher” através da qual o homem cai, e a “mulher” através da qual ele é redimido, são uma e a mesma coisa, a diferença entre elas sendo apenas de condição. Nenhuma delas é uma mulher. Mas ambas implicam aquele princípio no homem que, por ser de natureza e potência feminina, a Bíblia chama de “a Mulher”: ou seja, a alma e sua faculdade de intuição. Isso porque, como um livro da alma, a Bíblia trata de princípios e se dirige à alma, provando, desse modo, que sua inspiração é de origem Celestial e Divina.

            2. O Sacerdotalismo, ao contrário disso, em razão de sua falta de qualquer senso de coerência, de sua ignorância quanto aos princípios e processos da alma, bem como do significado da simbologia da Bíblia, tem – por meio de seu tratamento da “Mulher” – provado que sua inspiração é de origem astral e infernal; uma vez que seus métodos tão exatamente reproduzem aqueles das influências assim designadas.

            E daí tem-se que, ao invés de ver que o processo da Redenção deve necessariamente ser o exato inverso daquele da Queda, e que ambos devem ser espirituais, e não pessoais, o Sacerdotalismo atribuiu a Queda a uma mulher, e jogou toda a culpa da Queda sobre ela e seu sexo, marcando-a com o estigma da inferioridade e da servidão, com o qual as mulheres têm, desde então, sido

(p. 33)

amaldiçoadas, e ignorou completamente o fato de que a Queda foi causada inteiramente pelo próprio Sacerdotalismo, através de sua sistemática deturpação de tudo o que ela [a Mulher] representa.

            3. Assim sendo, ao invés de buscar – trabalhando em prol do seu soerguimento – reparar os efeitos da Queda, o Sacerdotalismo a tem mantido subjugada para que ela não pudesse ser reerguida, tornando-a, desse modo, sua própria escrava desprezível.

            E o Sacerdotalismo tem confundido e obscurecido ainda mais a percepção do homem sobre a verdade a respeito da Mulher, primeiramente tornando-a a mãe física do homem Jesus, ao invés da mãe espiritual do Cristo no homem – relacionando absurdamente sua “virgindade” ao corpo, ao invés da alma, corrompendo de forma blasfematória as concepções do homem, tanto em relação ao método divino como em relação à sua própria natureza. E, mais ainda, ao identificá-la com a Igreja, significando o próprio Sacerdotalismo, perverteu as condenações do Apocalipse a respeito do Sacerdotalismo, transformando-as em glorificação de si mesmo.

            Pois, ainda que seja verdade que a “Mulher” – a quem a Escritura exalta ao atribuir-lhe a redenção do homem – se refira, em um de seus aspectos, à Igreja, não se refere à Igreja tal como constituída e definida pelo Sacerdotalismo, mas sim à Igreja da coletividade das almas dos homens redimidos do poder do Sacerdotalismo, por meio de sua própria restaurada intuição da verdade, o que acarreta na exposição e derrocada do Sacerdotalismo.

            4. A rejeição da Intuição pelo mundo de nossos dias se deve, em grande parte, à crença de que ela afirmaria a posse de conhecimentos adquiridos independentemente da experiência. No entanto, a definição que já foi dada aqui quanto à natureza da Intuição aponta o erro dessa crença, mostrando que ela está baseada em um completo equívoco.

            Em razão desse equívoco e de suas conseqüências, o Sacerdotalismo tornou-se o responsável por suprimir a verdade quanto a natureza da alma e sua pré-existência, suprimindo também a verdade acerca das conseqüentes oportunidades da Alma adquirir conhecimentos por meio da experiência. Pois aquilo que a intuição representa é precisamente aquele conhecimento positivo que a alma adquiriu por meio da experiência, a respeito de

(p. 34)

Deus, do mundo e do homem, durante as longas eras de seu passado como um ente individual.

            Muito longe de ser um mistério, e muito longe de o conhecimento assim adquirido, por meio de tal organon [instrumento], ser abominável, impensável, inacreditável ou mesmo obscuro e ininteligível – crença cuja aceitação e afirmação involve o suicídio intelectual e moral, que o Sacerdotalismo impõe aos seus devotos – esse conhecimento da Intuição representa o próprio bom senso do homem em sua modalidade mais elevada.

            Isto porque se trata daquela verdade que no mais íntimo de seu coração ele sempre sentiu e almejou, e quase acreditou, mas a qual – devido ao véu de sangue lançado pelos seus sacerdotes, tanto sobre o universo como sobre a sua própria visão – ele se tornou incapaz de ver. Pois ela é aquela perfeita verdade e perfeita bondade que, não fosse pela afirmação dos sacerdotes em sentido contrário, o homem teria acreditado se tratar de Deus.

            5. E é por meio da “mulher”, a Intuição, que o homem alcança seu bom senso [em inglês: common sense], nesse que é seu nível mais elevado. E que esse seja, com toda verdade, seu nível mais elevado, é porque a conclusão que ele compreende é a concordância entre, não apenas de todos os seres humanos, mas entre todas as partes do ser humano.

            E sendo isso, ele é a concordância, ao mesmo tempo, do Homem Completo, e do homem íntegro, do homem sadio e, nesse sentido – como só ele pode ser – do homem lúcido. Pois ele é a conclusão, não de uma maioria, por maior que ela possa ser, constituída de homens rudimentares em razão de sua falta de desenvolvimento, ou de homens mutilados pela supressão daquela metade essencial do sistema humano, a intuição.

            Não se trata, portanto, da conclusão alcançada por seres humanos “subjugados sob o altar” e “na prisão” de seus elementos inferiores; não por uma maioria de trogloditas espirituais enterrados profundamente nas cavernas da materialidade e incapazes de aspirar para além do inferior e do corpóreo. É, sim, a conclusão do homem substancial e real; do homem emancipado, livre e desenvolvido em relação à consciência de todas as múltiplas esferas e modalidades do Ser, de onde a infinita e eterna Plenitude Se diferencia e Se distribui

(p. 35)

no universo para tornar-se individualizada no ser humano. Ela é a conclusão, em suma, do homem que, reconhecendo Deus tanto como a Força quanto como a Substância da Existência, O reconhece igualmente como Pai e Mãe, e tem, nesse sentido, buscado, pelo desenvolvimento em si mesmo de todos os princípios, propriedades, qualidades e atributos, respectivamente masculinos e feminos, do Ser, tornar-se realmente – visto que espiritualmente – o que foi descrito com "feito à imagem de Deus, homem e mulher" [Gênesis 1:27], adicionando ao intelecto, a intuição, à mente, a consciência moral, e à vontade, o amor – representando assim, ao mesmo tempo, o Humano Completo e a Deidade Completa.

            6. Tal é o bom senso [common sense], e tais são os resultados, acrescidos ao homem através dela, a mulher mística das Escrituras, tão desprezada e rejeita pelos sacerdotalismos do mundo, tanto da religião como da ciência; desde que ele observe as condições prescritas em relação a ela.

            7. Essas condições são aquelas que, por serem indispensáveis para que o homem alcance sua própria perfeição, são atributos do Cristo. Como quando se diz que “ele vem atando o seu burrico à videira, e o filho da sua jumenta à videira seleta, e lava suas roupas em vinho e a sua vestidura em sangue de uvas” [Gênesis 49:11]. Assim montado e assim purificado, ele cavalga como rei em triunfo para dentro da cidade sagrada de seu próprio sistema regenerado.

            Pois aquele a quem essas metáforas representam é a união dos dois modos da mente, o Intelecto e a Intuição, em um espírito puro. Ao preencher essas condições, o homem se tornar, como é dito: “tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque” [Hebreus 17:7]. Pois aquilo que essas metáforas denotam é a união das duas modalidades a mente, o Intelecto e a Intuição, em um espírito puro. Ao preencher essas condições o homem se torna “um sacerdote para sempre na ordem de Melquisedeque” [Hebreus 17:7]. Pois aquilo que esse nome implica é o perfeito equilíbrio entre essas duas faculdades, como o rei e a rainha do sistema mental do homem.

            Ao possuir uma mente como essa, o homem tem “a mesma mente que estava em Cristo Jesus” [Filipenses 2:5], e é “ungido de Deus”, estando repleto do Espírito, e não mais sujeito às limitações da matéria. E estando assim reconstituído dos elementos de seu sistema – sua substância e sua vida – em sua condição divina, uma vez que pura, ele é descrito como sendo “renascido da

(p. 36)

água e do espírito”, e tendo por pais a “Virgem Maria e o Espírito Santo”, e como sendo ao mesmo tempo filho de Deus e do Homem, e sendo portanto “Deus-Homem”. Pois o ser assim divinamente gerado no homem é Deus tornando-se homem, e homem permanecendo Deus. Tal e tão simples, óbvia, razoável e divina, quando interpretada em seu sentido verdadeiro, é a doutrina que o Sacerdotalismo tornou a um só tempo incompreensível e blasfematória.

            8. Não foi apenas do processo indispensável a outros que Jesus falou quando Ele disse, como por exemplo a Nicodemus: “Deveis nacer novamene da água e do Espírito”. Nisso declarou como Ele próprio foi gerado. Pois “água e o Espírito”, “água e o sangue”, “Espirito e Noiva”, “Espírito de Deus se movendo sobre a face das águas”, “Virgem Maria e Espírito Santo” – todos esses são apenas diversas maneiras de significar o mesmo dualismo existente no Ser, o dualismo da Força e da Substância, em virtude do qual Deus é igualmente Pai e Mãe, e criação e redenção se dão pela geração.

            Os dois aspectos são igualmente Espírito, pois de nenhum outro modo poderia haver relação harmônica entre eles. E sendo espírito eles são substância viva, e sendo substância viva eles são chamados de “sangue” – significando o sangue divino da vida divina, a vida que é Deus, mesmo o próprio ser de Deus, que Deus está sempre emanando por igual para a criação, a sustentação e a redenção do universo.

            E é em consonância com essa vida e substância espirituais que o amado Apóstolo, que é o único que as compreende e as registra – aquele a quem no fim o Cristo, como Filho da “Mulher”, a Intuição, entrega sua "Mãe” – contempla verter do lado perfurado de seu Mestre, o “Cristo interno”, e não o Cristo “segundo a carne”, como aquele expoente dos místicos e ocultistas, o Apóstolo Paulo, declara claramente.

            9. Agora, com relação à regeneração, é necessário dizer o que segue: – Por se dar a partir de fora do corpo, o processo deve ser realizado, pelo menos em grande parte, enquanto no corpo.

(p. 37)

E por ser longa e gradual, ela se estende por muitas vidas terrenas. A doutrina da multiplicidade das vidas terrenas, anteriormente chamada de transmigração e de retorno das almas, e agora de reencarnação, era universal nas Igrejas pré-cristãs, e está implícita ao longo de toda a Bíblia, sendo que algumas vezes também explicitamente.

            Mas o Sacerdotalismo, ao assumir o estilo e o título de cristão, achou conveniente ocultá-la e refutá-la. A razão disso não é difícil de achar, agora que a fonte e os motivos que inspiram o Sacerdotalismo estão revelados. A reencarnação é a condição para a regeneração, tornando-a possível ao oferecer as oportunidades necessárias de experiência. E a regeneração se dá por meio da purificação interior, sendo esse o segredo e o método do Cristo. Mas os controladres do Sacerdotalismo queriam sangue para si mesmos. Assim, a regeneração foi engavetada para dar espaço para a sua substituição. Como os seres infernais sabiam, e o evento se provou verdadeiro, dê aos homens um Deus que ame o sangue, e eles inundarão a terra com sangue para Sua glória. Pois, “assim como no céu” – a concepção do homem acerca de Deus – “também na terra”. O homem sempre se fez segundo a imagem na qual ela faz de seu Deus.

            10. Não que a doutrina do sacrifício seja falsa, mas somente aquela do sacrifício vicário. Pois, como diz o novo Evangelho da Interpretação, enfatizando e reforçando o velho Evangelho da Bíblia – não há tal coisa como uma redenção vicária, pois ninguém pode redimir a um outro por meio do derramamento de sangue inocente. A justiça não pode ser saciada com a punição do inocente pelo culpado, mas na verdade, o inocente é com isso duplamente ultrajado.

            Nenhum homem pode assumir o pecado de outro, nem deve ele pagar pela transgressão de seu irmão; mas cada um deve carregar seu próprio pecado, e ser purificado por sua própria correção. Remover o sofrimento do homem é remover seus meios de redenção. Tão somente se, através do próprio sofrimento, ele se arrepender, poderá receber perdão. “A alma que peca, ela própria morrerá”, e nenhuma outra em seu lugar. E ele não se libertará do estado de ser no qual pecou –

(p. 38)

até ter pago o último vintém; porém retornará a esse estado, repetidamente, até que tenha conquistado sua própria salvação, e não esteja mais propenso a pecar. É por isso que, "desde Adão até Cristo”, desde a Queda até a Redenção, há tantas "gerações". Elas são os degraus para o progresso do próprio homem. É verdade que o homem, considerado como a personalidade exterior, não sabe que ele está pagando pelas faltas de suas vidas passadas. Nem tampouco ele propriamente está fazendo isso; pois como personalidade exterior ele não tem vidas passados, sendo renovado a cada nova encarnação.

            Mas o homem considerado com a individualidade interior conhece isso e sua responsabilidade existe na medida em que ele negligencia ou atenta ao conhecimento, que é a voz da consciência falando nele. Tal sacrifício constitui também um ato de unificação. Pois por meio dele o homem se torna uno com o Espírito Divino dentro dele, alcançado após longo tempo o estado de Cristo. E o princípio em virtude do qual isso ocorre nele, e o processo correspondente, são ambos “Cristo”. Pois por Cristo se representa não apenas uma pessoa, uma posição e um estado espiritual, mas também um princípio e um processo. De modo que, mesmo que o homem seja salvo por “Cristo”, ele não é salvo vicariamente, no sentido eclesiástico.

 

NOTA

 

(33:*) N.T.: Essas numerações referem-se às paginas e aos parágrafos no original.

 

 

Índice Geral das Seções   Índice da Seção Atual    Índice da Obra Atual   Anterior: A “Mulher” Não é uma Mulher, Mas Sim a Alma e a Intuição   Seguinte: Verdadeira e Esotérica Doutrina da Encarnação Divina